terça-feira, 30 de novembro de 2010

APRENDENDO A GOSTAR DE SEGUNDA-FEIRA

Alguém já disse que o melhor da segunda-feira é que é o dia mais distante da próxima segunda-feira. Ou mais próximo da próxima sexta-feira. Em qualquer dos casos, faz referência à disposição negativa da cultura ocidental em relação ao trabalho.

TRABALHO, CAOS E ORDEM
Provavelmente em razão da leitura equivocada do Gênesis, que associa o trabalho a expressões como “a terra será maldita por tua causa e produzirá espinhos e ervas daninhas”, e “com o suor do teu rosto comerás o pão”, proferidas por Deus a Adão, conforme a narrativa bíblica, o consenso cultural afirma o trabalho como maldição.
          Mas há um elo perdido nessa história. O oposto da terra amaldiçoada é o paraíso do Édem, um jardim habitado não apenas pelo primeiro casal, como também por animais de todas as espécies. Ali no Édem estavam Adão e Eva, incumbidos de “dar nomes aos animais”, isto é, identificar, codificar e classificar, condições necessárias para sua responsabilidade de exercer domínio sobre todos os demais seres criados, além da tarefa de cultivar o jardim. Isso significa que o trabalho não é uma experiência posterior ao paraíso no Édem. No paraíso havia trabalho, o primeiro casal recebera delegação divina para zelar pelo belo e pelo útil, duas dimensões essenciais da existência humana.
          A Bíblia Sagrada oferece, portanto, dois paradigmas para experiência humana do trabalho: o jardim e a terra amaldiçoada, respectivamente a possibilidade de um mundo de flores e frutos, contra um mundo cheio de espinhos e as pragas daninhas. Usando palavras gregas, podemos dizer que a terra amaldiçoada representa o caos e o jardim representa o kosmos. A expressão caos reflete o equivalente hebraico “tohu wa bohu”: sem forma e vazia. E a expressão kosmos o conceito hebraico de shalom: a harmonia que resulta em abundância de tudo para todos.
          Partindo dessas metáforas, caos e kosmos, podemos concordar com o bispo Anglicano Desmond Tutu, quando disse que “é através do trabalho que cooperamos com Deus”, e extrair uma definição: trabalhar é cooperar com Deus para colocar ordem no caos. O trabalho, portanto, deveria e poderia ser uma experiência rica de sentido e significado e uma fonte de realização humana, pois originalmente a experiência de trabalho não era incompatível com a vida no paraíso.

TRABALHO E FELICIDADE
          Poucas pessoas descreveram tão bem o espírito do nosso tempo como Otávio Frias Filho, ao comentar que “vivemos numa época que cultiva a subjetividade tanto quanto nenhuma outra, que considera cada vez mais a busca da felicidade pessoal, entendida como ampliação dos prazeres e ganhos individuais, como o mais legítimo dos propósitos” [Queda livre: ensaios de risco. São Paulo: Cia. Das Letras, 2003].
          O conceito de felicidade como algo de dimensão pessoal em termos de prazeres e ganhos individuais é abolutamente idiota. Convida o ser humano a descer ao nível dos bichos, que vivem apenas e tão somente para a satisfação de seus apetites particulares e instintos basais.
Ed René Kivitz

Fonte:
Site: vigiai.net

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